domingo, abril 05, 2009

Libertem Anarco, imediatamente!

Libertem Anarco, imediatamente!


Era a segunda ou terceira manifestação que eu participava em minha vida.
Acho também que foi a primeira vez que fui àquela cidade.

Foi em 1998 e era um dia de clima instável no Rio de Janeiro.

O motivo da caravana da Universidade Federal de São Carlos: somar-se ao
ato que buscava impedir a privatização da empresa estatal de
telecomunicações, a TELEBRÁS.

Naquele dia tínhamos uma missão muito difícil, pois, apesar de ser uma
manifestação bastante forte, carregávamos uma bandeira que não era
empunhada por quase ninguém além da vanguarda do movimento social
organizado. Fernando Henrique possuía naquele período apoio popular para
suas medidas neoliberais, promovendo verdadeira liquidação das empresas
mais importantes e determinantes para um mínimo grau de soberania política
para o país.

Logo que chegamos à cidade e a quilômetros da Bolsa de Valores do RJ
(local do leilão de privatização da empresa) sentíamos o clima de
repressão construído para nossa manifestação. Prenúncio do que acorreria
minutos depois.

Ainda com metade das pessoas descendo dos ônibus para se integrar ao ato,
vimos perfilar ao nosso lado muitos destacamentos da Tropa de Choque que,
batendo as botas no asfalto e os cacetetes nos escudos, começaram a
marchar em direção à manifestação.

Andamos de costas para nos integrar à manifestação porque, mesmo antes de
cumprimentar os demais companheiros do ato, já precisávamos nos defender
do cacetetes, gás pimenta e demais “utensílios de convencimento” do estado
democrático de direito.

Uma série de fatos aconteceu muito ligeiramente.

Em segundos vimos os policiais derrubando as barracas do acampamento do
MST que foi abrigo dos manifestantes durante a vigília na noite que
precedia o leilão. A polícia, em covardia nada inédita, mas repugnante
como sempre, golpeavam com cacetetes de madeira as mulheres e crianças que
estavam presas embaixo das lonas pretas. Simultaneamente, o caminhão de
som da manifestação era guinchado pela polícia, prendendo toda a
coordenação do ato que estava sobre ele.

Esse foi apenas o início do início de um confronto que durou horas no
centro velho do Rio de Janeiro, nas adjacências da Rua do Ouvidor - foi
buscando uma referência para evitar nossa dispersão que conheci essa
famosa rua.

Quem participou daquela manifestação certamente possui muitas descrições
das ações que realizamos naquele dia durante as horas de enfrentamento com
a polícia. Esta por sua vez não queria somente acabar com a manifestação,
queria humilhar sobremaneira todas as organizações e participantes daquele
momento onde se vendia a preço de casca de banana a TELEBRÁS.

Anarco, que era estudante da UFSCar, com sua câmera em punho, foi um dos
primeiros estudantes que desceram do ônibus. Ele não permaneceu mais que
três minutos no ato, sendo preso depois receber socos e pontapés. Qual foi
o crime que Anarco cometeu? - Lutar com uma máquina fotográfica contra a
privatização da Telebrás.

Anarco foi um dos dois ativistas que foram detidos de nossa delegação de
São Carlos/SP. Outro companheiro também foi J. D., militante à época da
organização O Trabalho/PT.

Esse companheiro inclusive foi preso por ter me defendido de uma ação da
polícia, pois depois de ter entrado em confronto direto com alguns
soldados da Choque, eu fui detido por um policial à paisana que estava
dentro de nossa coluna. Não sei como (sei que foi uma combinação de medo e
coragem) consegui me livrar. Esse P2 então me apontou para um dos
comandantes da Choque que, por sua vez, destacou alguns “Comandos em Ação”
para me prender. Desta vez, mais com medo do que com coragem, me soltei
dos soldados e sai correndo. Nem Usain Bolt me alcançaria naquele dia,
tamanho impulso que o medo havia me dado.

Como os policias foram atrás de mim, J. D. entrou na frente de um deles,
buscando impedir o progresso do policiais. Tamanha era a ânsia em
desmontar o ato que os policiais marcaram J.D. e, depois de uns dez
minutos, voltaram com uma viatura e o prenderam.

Anarco e J.D. forarm detidos e depois liberados.

Na última semana, quase onze anos depois daquela manifestação, meu
camarada João Zafalão, que era o principal dirigente do DCE da UFSCar em
98 (hoje membro da direção executiva da APEOESP pela oposição) me ligou e
me informou que Anarco fora preso e encarcerado na cidade de Araraquara
por julgamento do processo aberto naquela manifestação no dia da
privatização da TELEBRÁS.

Surpresa. Revolta!

A prisão de Anarco é um ataque, dentre outros muitos e não menos
importante, aos movimentos sociais organizados. É parte de uma ação
combinada entre governo e todas as suas instituições para criminalizar
organizações e pessoas que dedicaram e/ou que ainda dedicam esforços para
construir uma nova sociedade.

Nesses anos passados, os trabalhadores mudaram de opinião sobre as
privatizações. Sabem que se entregou para multinacionais empresas
fundamentais e que recebemos em troca altas tarifas e péssimos serviços.
Essa mudança nos dá muito melhores condições de derrotar as privatizações.

Apesar disso, as privatizações ainda continuam. Lula, por exemplo,
privatiza estrada, vende poços de petróleo e, sob a forma de “privatização
branca”, entrega o controle da Petrobrás às empresas privadas.

A prisão de Anarco e a continuidade das privatizações demonstram que a
luta daquela manifestação em 1998 continua sendo muito necessária.

Na verdade, a libertação de Anarco é condição para avançarmos na luta
contra aqueles que estruturam suas vidas sobre a destruição da natureza,
sobre a opressão e o desgraçar de vidas de jovens, mulheres, negros e
homossexuais.

A liberdade de Anarco é parte da luta contra aqueles que vivem às custas
da exploração do suor da classe trabalhadora.



Solidariedade total ao companheiro Anarco!

Nenhuma prisão daqueles que lutam!



JJ

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