A mesma rede de televisão que induziu grande parte da população brasileira a votar em Fernando Collor de Melo nas eleições de 1989, apoiou o governo de FHC, aquele presidente que chamou os aposentados de nosso país de vagabundos e, provavelmente, fará (ou já está fazendo?) campanha para José Serra a Presidência da República nas eleições desse ano, fez hoje, 27 de janeiro de 2010, em seu telejornal transmitido nacionalmente em horário nobre o que era de se esperar dela, falo da Rede Globo de televisão.
Vi as manchetes na chamada inicial do Jornal Nacional da Rede Globo contendo notícias entre outras, sobre o MST, a Venezuela, a posição do Brasil diante da situação em Honduras e do presidente Hugo Chávez. Vamos as abordagens de cada tema especificamente para entendermos melhor como acontece a manipulação das informações por parte da mídia corporativa.
MST
Sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que teve 9 de seus membros presos nos últimos dias por conta da ocupação de terras na cidade de Iaras, no interior paulista que, diga-se de passagem, são as mesmas terras que foram griladas pela empresa Cutrale, produtora de suco de laranja e serve ao capital internacional, área essa que pertence a União e não a empresa.
No Jornal Nacional, foi mostrado um vídeo que, segundo o famoso casal de jornalistas da bancada, seria a demonstração das verdadeiras intenções do movimento na ocupação. O trecho do vídeo foi escolhido minuciosamente de acordo com os interesses dos empresários envolvidos, pois mostra um integrante do movimento dizendo que a ocupação seria para dar prejuízos. O telejornal global mostra a situação como se a empresa estivesse em plena razão de requerer a reintegração de posse e a prisão dos trabalhadores rurais que fizeram a ocupação de área que é da União e não da empresa. Engraçado que a Justiça sequer mencionou a possibilidade de prender algum acionista da Cutrale, quando a empresa grilou essa área no interior paulista, porém quando trabalhadores pobres que lutam por uma divisão justa da terra, ocupam o espaço, em protesto contra os grileiros e, como forma de denúncia, derrubam pés de laranja, que é um símbolo do agronegócio que usa o solo brasileiro para o benefício das grandes empresas agro-exportadoras sem visar, em nenhum momento, os interesses da população, a mesma rede de televisão que esteve o tempo todo ao lado dos militares durante a ditadura e de todas as atitudes danosas dos governos autoritários contra o povo brasileiro, tenta mostrar aos telespectadores que a empresa tem razão em roubar terras de nosso povo para satisfazer sua ânsia pelo lucro com as exportações. O que causa prejuízos à população é o agronegócio que a Cutrale fomenta e participa. Entre outros danos, a geração de um grande número de desempregados no campo que acabam indo para as periferias das cidades em busca de emprego por causa da mecanização no campo, promovida pela ditadura da produtividade no agronegócio em busca de preços mais competitivos no mercado internacional. Isso não é falado pelas grandes redes de televisão e órgãos da imprensa escrita, por que será? O leitor, por acaso, saberia responder?
Venezuela
Foi falado no telejornal global que o presidente venezuelano, Hugo Chávez, numa escalada autoritária, tirou 6 redes de TV a cabo do ar por se recusarem a transmitir os discursos dele. E ainda, que em manifestações morreram 2 jovens, num tom que leva os passivos telespectadores a pensar que a situação na Venezuela promovida por Chávez é criminosa. Nessa notícia percebemos a manipulação através da omissão de informações, que é uma característica dessa conhecida rede de televisão brasileira.
Primeiro: quem tirou as 6 redes de TV a cabo do ar não foi o presidente Chávez, mas sim, a Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel) que é encarregada de fazer cumprir as leis na área de comunicação na Venezuela e tem como diretor geral o Ministro do Poder Popular para Obras Públicas e Moradias, Diosdado Cabello (que nem é citado na matéria do Jornal Nacional). As redes de televisão a cabo foram autuadas por desobedecer a Lei de Responsabilidade Social de Rádio e Televisão que obriga as tv’s a cabo a terem 12,7% de conteúdo nacional durante sua programação. Detalhe, as medidas tomadas pela Conatel tiveram apoio dos Produtores Nacionais Independentes (PNI), da Unidade Popular Venezuelana (UPV), da Universidade Bolivariana da Venezuela entre outros grupos organizados do país.
Em comunicado destinado a Conatel, os Produtores Nacionais Independentes afirmam “foi uma ação desesperada do diretor geral da RCTV [canal de televisão privado que não obteve renovação da concessão estatal em 2007, devido a participação ativa da rede no golpe de Estado contra o governo de Hugo Chávez em 2002, situação que é mostrada no documentário “A Revolução Não Será Televisionada”], Marcel Granier, para manter a censura no seu canal ao presidente da República, Hugo Chávez Frías, e a tudo que tenha de positivo a Revolução Bolivariana”. Veja o comunicado na íntegra (http://www.conatel.gob.ve/download/comunicado.pdf)
Segundo: também foi dito no telejornal global que morreram 2 jovens venezuelanos em protestos por causa dos acontecimentos relacionados ao fechamento dos canais de tv a cabo. Isso é fato, morreram 2 jovens mesmo, mas no jornal não é falado que os 2 jovens mortos eram apoiadores das medidas contra os canais de tv a cabo e foram assassinados por membros da oposição ao governo que estão do lado dos canais autuados pela Conatel. É assim que a direita tem agido na Venezuela, manipula informações através de sua mídia, convocando as pessoas da classe média e os grupos fascistas para manifestações contra o governo, buscando o confronto para colocar a culpa no chavismo e justificar suas atitudes golpistas. Isso foi feito para legitimar o golpe de Estado em 2002, mas não deu certo graças ao povo venezuelano, que foi às ruas, e aos soldados de baixa patente que desobedeceram a hierarquia das Forças Armadas e retomaram o controle do Palácio de Miraflores, em Caracas, e foram tratar de resgatar Chávez, que iria ser fuzilado pelos generais golpistas, para colocá-lo de volta em seu posto, concedido a ele através do voto popular. Até quando a maioria da população vai continuar passiva diante da televisão recebendo as informações dessas grandes redes como se fossem verdades inquestionáveis?
Posição do Brasil diante de Honduras e da Venezuela
Os mesmos jornalistas que omitiram do povo brasileiro as infomações acerca da luta pela terra no interior paulista e das questões relacionadas à Venezuela, o fizeram novamente, além de se aproveitar do analfabetismo político dos brasileiros, quando foram tratar da posição do governo Lula, que segundo os jornalistas da bancada era contraditória, com relação a Honduras e a Venezuela.
Na matéria é mostrada que a posição do Brasil nos dois casos pareceria contraditória, segundo os jornalistas globais. Na questão em Honduras, o governo brasileiro rechaçou o golpe fascista que depôs o presidente, Manuel Zelaya, e em diversas situações envolvendo o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, Lula teria apoiado o mandatário venezuelano. Percebemos o aproveitamento do analfabetismo político da população brasileira por parte da rede de televisão.
Não houve contradição alguma nas ações do governo brasileiro nesses casos. As duas situações são completamente distintas, a grande mídia brasileira quer induzir os brasileiros a crer que na Venezuela não existe democracia. Na Venezuela existe mais democracia do que no Brasil. Nossa atual Constituição foi aprovada em referendo popular como na Venezuela? Sabemos que não. Nossa atual Constituição, por acaso, permite que o mandato do presidente seja interrompido mediante um referendo popular, convocado por meio de um abaixo-assinado? Infelizmente não. Detalhe, a oposição venezuelana já utilizou esse mecanismo, mas o povo decidiu que Chávez deveria continuar como presidente com aproximadamente 60% dos votos no referendo. O que acontece é que na Venezuela está sendo combatida a ditadura da grande mídia com a democratização da informação, o incentivo as produções nacionais e as rádios comunitárias através das leis de telecomunicações do país e isso não agrada aos proprietários dos meios de comunicação privados da Venezuela.
Em Honduras o presidente, Manuel Zelaya, tomou diversas medidas em benefício da maioria da população hondurenha, como o aumento de 65% no salário mínimo, provocando reações da elite local, culminando no golpe de Estado em 28 de junho de 2009. Nossa grande mídia enfatiza que Zelaya tinha a intenção de reformar a Constituição para poder se reeleger. Na verdade, o referendo popular foi convocado para perguntar ao povo hondurenho se deveria ser convocada uma Assembleia Constituinte no país, com intuito de escrever uma nova Constituição com participação popular. Isso certamente não é do interesse de empresários, latifundiários e grandes banqueiros de nenhum lugar do planeta. O golpe de Estado fascista era uma reação esperada por quem conhece a História e a lógica do sistema capitalista. Poucos dias após a deposição de Zelaya, os golpistas fizeram modificações nas leis e recomendações instituindo o toque de recolher, a perda dos direitos individuais, entre outras medidas conhecidas dos brasileiros durante o regime militar em nosso país.
Como o governo brasileiro iria apoiar um golpe de Estado fascista, de extrema-direita? O governo Lula não tem sido coerente em muitos momentos, como na defesa da permanência de José Sarney na Presidência do Senado durante crise política recente na instituição, na aliança que mantém com Collor e outras figuras indesejáveis, entre outros acordos para conseguir fazer com que seus projetos sejam aprovados na Câmara e no Senado. Mas com relação a posição do Brasil na situação em Honduras e na Venezuela esse argumento não cabe. Em Honduras houve um golpe militar, direitos individuais foram suspensos, foi a resposta da oligarquia local aos avanços sociais promovidos pelo governo de Manuel Zelaya e na Venezuela existe uma democracia funcionando com mais participação popular do que nos países alinhados com os EUA. Só não é a democracia que os norte-americanos gostam, onde os grandes empresários, latifundiários, acionistas de multinacionais entre outros grupos bancam as campanhas dos políticos e depois exigem o esforço deles para a aprovação de leis que favoreçam seus negócios. Chávez não estava errado ao dizer certa vez que o Senado brasileiro age “como um papagaio” do Congresso americano. O telejornal tenta demonstrar uma contradição como se as situações na Venezuela e em Honduras fossem semelhantes. Mais um absurdo dessa rede de televisão que chega a tantos lares brasileiros e consegue convencer boa parte de seus telespectadores passivos com seu discurso contra o próprio telespectador.
Este é um pequeno artigo, produto de minha indignação, ao ver os fatos postos para todo o Brasil, retratando situações pela metade e fazendo a todos nós de imbecis em frente a televisão. O problema é que isso não foi só hoje, essa grande rede de televisão faz isso desde a década de 1960 neste país com seus jornais veiculando informações de acordo com interesses empresariais e ainda dá de presente ao povo, suas novelas, programas humorísticos e de auditório para anestesiar a população de analfabetos políticos, na intenção de manter essa forma de analfabetismo.
Prof. Juca